terça-feira, 21 de maio de 2013

Ignacy Sachs e a nave espacial Terra




Luiz Carlos Bresser-Pereira

O século XX foi o século da ciência e, por isso, foi marcado por significativos avanços econômicos. Seu preço, porém, foi grande, porque levou os cientistas sociais— principalmente os economistas — a uma tentativa de separação radical entre a ciência e a moral em nome de uma arrogante visão de seu tema de estudo. Uma coisa é o mundo do ser, outro, o do dever ser, mas se essa distinção for realizada de maneira linear ao invés de dialética, o resultado será ou uma crença excessiva na ciência e a atribuição de papel secundário às questões morais, ou a adoção de uma postura normativa racional e moralista. Ignacy Sachs é e sempre foi um economista, mas jamais padeceu do primeiro mal, tão frequente entre eles.

Pelo contrário, ainda que soubesse bem a diferença entre os dois campos, não se deixou levar pelo belo canto da ciência. Para ele uma ciência social só é legítima se for referida a valores. “Nada de parar o crescimento enquanto houver pobres e desigualdades sociais gritantes; mas é imperativo que esse crescimento mude no que se refere a suas modalidades e, sobretudo, à divisão de seus frutos. Precisamos de outro crescimento para um outro desenvolvimento” (2009a: 232).
Ignacy Sachs é hoje o principal economista mundial do eco-desenvolvimento. É o economista que, conjuntamente com Maurice Strong e Marc Nerfin, ajudou a redigir a declaração final da Conferência das Nações Unidas de Estocolmo, de 1972, a partir da qual a proteção do ambiente se transformou em um problema e um objetivo mundial. Antes disso, porém, ele é um dos pioneiros da teoria econômica estruturalista do desenvolvimento (development economics) — uma teoria econômica desenvolvimentista que teve seu auge nos anos 1950, entrou em crise a partir de meados dos anos 1970 — quando a teoria econômica dominante se torna neoclássica e neoliberal — mas está reemergindo nos anos 2000 com o nome de macroeconomia estruturalista do desenvolvimento. Outra forma de definir Ignacy Sachs é dizer que é um grande intelectual que rejeita a torre de marfim da universidade — da École des Hautes Études en Sciences Sociales, onde ele ensina — e está sempre e vigorosamente mergulhado na prática. Nessa prática, ele está sempre na defesa de seus ideais de liberdade, justiça social e defesa do meio ambiente; sempre utópico portanto, mas, também, sempre pragmático; sempre envolvido em definir e participar de projetos de interesse econômico, social e ambiental viáveis que fortaleçam os pobres, principalmente os camponeses, ou então encaminhem a solução dos grandes problemas globais como o do efeito estufa. Não aceitou as ofertas de cargos que recebeu dentro do sistema das Nações Unidas, mas adotou o conselho de seu mestre, Michael Kalecki, quando saiu da Polônia pela segunda vez: “Se puder, seja consultor. É absolutamente necessário adquirir uma experiência prática”.

No plano do método científico adota uma perspectiva histórica, rejeita os modelos hipotético-dedutivos da teoria neoclássica, e pensa pragmaticamente. Para ele não existe ciência social pura: “Quando nós deixamos de lado os modelos de teoria pura e nos voltamos para os mecanismos de ação mais ‘realistas’ de um sistema econômico particular em um quadro dado de circunstância, o uso de modelos se torna efetivo, e, na nossa opinião, recomendável” (Sachs, 1963: 21). Para ele a economia é teoria e é também forma de pensar associada à prática. Conforme nos diz, “as ciências sociais têm essencialmente um valor heurístico [de nos ajudar a pensar]. Ajudam a fazer as perguntas certas, cuja pertinência e articulação não são nada evidentes e que não viriam ao espírito de um observador pouco experiente. Mas as respostas a essas perguntas só podem vir da práxis” (2009a: 323).
Ignacy Sachs possui tripla nacionalidade: ele é polonês, brasileiro e francês; e é quase indiano porque fez seu doutorado em economia na School of Economics de Delhi. É polonês porque nasceu na Polônia, fugiu do nazismo com seus pais do nazismo em 1939, e voltou à Polônia depois da Segunda Guerra Mundial. Brasileiro, porque acabou chegando ao Brasil em 1941, com 13 anos, e aqui fez seu curso de graduação em economia, e porque transformou o Brasil e seu governo, independente do partido que esteja no poder, no principal objeto de seus conselhos e trabalhos. Em 1954 retornou à Polônia para trabalhar no governo e fazer seu doutorado, mas este ele realizou na Índia onde atuou como segundo secretário da embaixada polonesa durante três anos, entre 1957 e 1960. Conheceu Michael Kalecki — o fundador da macroeconomia ao lado de John Maynard Keynes, e um dos economistas associados às Nações Unidas que, no após Segunda Guerra Mundial, criaram a teoria econômica do desenvolvimento — na sua primeira estada em Varsóvia, tornou-se amigo dele na Índia, e, de volta à Polônia, tornou-se um de seus principais assessores, dirigindo o novo Centro de Economias em Desenvolvimento. Em 1968, quando o antissemitismo voltara a tomar conta do seu país de nascença, Sachs novamente foi para o exílio, agora na França, onde logo se tornou professor da EHESS e fundou o Centro de Estudos sobre o Brasil Contemporâneo.
 
Ignacy Sachs faz parte da segunda geração dos economistas da teoria clássica ou estruturalista do desenvolvimento. A primeira foi a de Rosenstein-Rodan, Hans Singer, Gunnar Myrdal, Michael Kalecki e Raul Prebisch; a segunda de Celso Furtado, Albert Hirschman, Hollis Chenery e dele próprio. O privilégio de ter tido Michael Kalecki como inspirador de sua tese sobre a Índia é algo que Ignacy jamais deixa de sublinhar. Dessa forma, expressa uma velha verdade: o reconhecimento dos mestres é um sinal de grandeza dos discípulos. Sua tese de doutorado, Capitalismo de Estado e Subdesenvolvimento (1964) é um clássico da teoria do desenvolvimento. Nesse livro Sachs verifica que depois da Segunda Guerra Mundial o Estado havia aumentado sua participação na economia, e o modelo desenvolvimentista se tornara dominante tanto nos países ricos como nos países em desenvolvimento. Entre estes, que são seu tema, ele vê dois padrões de desenvolvimento. O modelo japonês envolve uma ampla associação entre a burocracia pública e a classe capitalista: “o setor público deve ter um lugar permanente apenas para cobrir as despesas sociais no campo dos serviços públicos, provendo finanças para as empresas privadas...; (b) o Estado poderá começar novas aventuras industriais, mas prevê-se sua privatização... (c) o Estado facilita a formação de grupos monopolistas”. Já o padrão indiano “prima por assegurar a primazia do Estado em setores básicos da indústria, enfraquecendo a concentração de capital privado — o que supõe um sistema abrangente de planejamento” (Sachs 1964: 95 e 202). Quanto ao Brasil, Sachs prevê a preponderância do modelo japonês. Afinal, sabemos hoje que foi o modelo japonês que prevaleceu não apenas no Brasil, mas em todos os países de desenvolvimento retardatário que realizam o catching up ou alcançamento — um modelo desenvolvimentista no qual o Estado controla e principalmente a planeja uma parte importante do setor monopolista da economia, mas privatiza o setor competitivo deixando sua coordenação por conta do mercado, e pratica uma política econômica ativa.

Economista, ele jamais perde de vista os aspectos éticos do desenvolvimento. Em A Terceira Margem (2009: 347), seu livro de memórias, ele defende um desenvolvimento includente que envolva o crescimento econômico, a diminuição das desigualdades e a proteção do ambiente. E dá especial importância ao problema do trabalho. Não apenas ao problema do emprego, mas também o do trabalho decente — “um trabalho convenientemente remunerado, levando-se em conta o nível de desenvolvimento do país, que se faz em condições de salubridade também aceitáveis e dá lugar a relações humanas que respeitam a dignidade do trabalhador”.

Ele é dotado de uma visão ampla e de um espírito crítico forte. Para ele a humanidade enfrenta hoje um impasse profundo. Para Sachs (2009b: 6), estamos sentados sobre as ruínas de quatro paradigmas: “Com a invasão da Tchecoslováquia em 1968 e o esmagamento de seu projeto de socialismo com rosto humano, o socialismo real começou sua agonia. A queda do muro de Berlim em 1989 anunciou seu enterro. A descida aos infernos da Argentina marcou o fracasso do paradigma neo-liberal conhecido pelo nome de Consenso de Washington. Que dizer do crescimento econômico aprofundando as desigualdades? Foi o caso do ‘milagre brasileiro’ na época dos generais e hoje é a China... Resta o paradigma social-democrata, que entrou em crise ao renunciar a suas origens socialistas. A aceitação incondicional da economia de mercado é incompatível com a intenção exibida de recusa da sociedade de mercado”.

Em seu paper mais recente sobre teoria do desenvolvimento econômico, “Revisiting development in the twenty-first century” (2009b), ele faz uma análise ampla da teoria econômica do desenvolvimento, de como ela prosperou nos 30 Anos Dourados do Capitalismo (1945-1975), e como entrou em crise nos 30 anos sombrios que se seguiram, os 30 Anos Neoliberais do Capitalismo. Analisa também a crise dos regimes que pretenderam implantar o socialismo mas falharam. Falharam “porque demonstraram não ser uma alternativa viável aos padrões de consumo e ao estilo de vida ocidental”, mas o principal problema foi político: afinal a União Soviética foi um regime autoritário que se impôs de forma imperialista na Europa Oriental. Existe, entretanto, uma alternativa para o capitalismo liberal: as “economias mistas” que, segundo ele nos informa, foram discutidas nos anos 1950, e publicadas mais tarde por seu mestre Michael Kalecki (1970), e por Shigeto Tsuru (1993). Em suas palavras, “O fracasso do socialismo real e os impasses da teologia neoliberal de mercado indicam que o sistema institucional dominante será o das economias mistas com um setor de mercado forte mas regulado, e com uma presença significativa do Estado desenvolvimentista” (2009b: 14).

Cada vez que o encontro, ele tem novas histórias a contar. Algumas se referem a seus projetos em defesa dos pequenos: como, por exemplo, quando assessorou o Sebrae a desenvolver um projeto de produção do dendê em unidades familiares combinadas com usinas empresariais de processamento. Outras vezes, ele está dando assessoria ao governo brasileiro, ou às Nações Unidas, sobre o desenvolvimento includente e autossustentável, ou sobre o aproveitamento da biomassa para a produção de energia autorrenovável. Em um trabalho escrito para a UNCTAD das Nações Unidas, “The biofuels controversy” (2007), ele não vê conflito entre a segurança energética e a alimentar desde que a produção de biomassa para a energia seja bem regulada pelo Estado, tendo como critérios não apenas custo, mas também interesse social e proteção ambiental. Em um trabalho mais recente, La Main Visible (2011a: 9), cujo subtítulo é “Ter êxito na entrada no antropoceno”, Sachs nos oferece uma grande visão da história da humanidade para discutir seu problema ambiental atual. Brincando com Molière ele nos diz que “da mesma forma que Monsieur Jourdain, em Le Bourgeois Gentilhomme, fazia prosa sem o saber, nós entramos em uma nova era geológica, o antropoceno, já há algum tempo e não nos apercebemos disto. Na verdade, com três séculos de atraso, já que a entrada no antropoceno data da Revolução Industrial”. Para Sachs duas grandes revoluções marcaram a humanidade: a Revolução Neolítica e a Revolução Industrial. A primeira revolução se estendeu do ano 9.000 ao ano 3.000 antes de Cristo, e foi marcada pela invenção da agricultura, pela domesticação de animais, pela transição das tribos errantes para as sociedades sedentárias, a pedra polida, a cerâmica, a metalurgia, o começo da urbanização, e o surgimento dos primeiros impérios ou das primeiras civilizações. É a passagem da pré-história para a história. Vivemos hoje no antropoceno porque, afinal, o homem apenas se tornou relativamente senhor da sua história a partir da Revolução Capitalista que, em cada país, é constituída pela respectiva revolução nacional e a revolução industrial. Antes as grandes civilizações correspondiam a impérios e nasciam e morriam juntamente com eles. Desde a revolução capitalista isto não mais acontece. Impérios modernos como os da Grã-Bretanha e da França podem ter entrado em decadência, mas a sociedade capitalista ou a civilização moderna continua forte, e, o que é mais importante, todos os países gradualmente aderem à ela, como, nos últimos 30 anos vimos acontecer de forma dramática com a China.
Sachs usa o conceito de antropoceno — um período da vida social no qual, como Marx salientava, o ser humano passa a ocupar o seu centro — para pensar a sociedade mundial atual como um todo e sua sobrevivência. Ele pensa no mundo como uma nave espacial que os homens e mulheres estão conduzindo. Como—, através das revoluções tecnológicas e do planejamento. Para onde? Sua preocupação fundamental é a de “assegurar aos 9 bilhões de humanos que viverão sobre a terra em 2050 uma vida digna de ser vivida sem deixar cair a nave espacial Terra” (2011a: 12). Para lograr esse objetivo — para organizar nosso futuro — cinco tarefas são cruciais para ele: o planejamento, a revolução energética, a revolução verde, a revolução azul, e a cooperação internacional.

Como desenvolvimentista que sempre foi, Ignacy Sachs acredita e defende o planejamento, mas de forma moderada. Lembra que este precisa envolver empresários, trabalhadores, a sociedade civil organizada, e o Estado. E não se trata de planificar toda a economia, mas os setores que não são competitivos e, portanto, que o mercado não tem condições de bem coordenar. O planejamento deve começar pelo nível local, e pela identificação, nesse nível, dos pontos de estrangulamento. Em seguida será necessário articular esses planos no nível regional e nacional. Algo que é preciso fazer gradual e permanentemente. É através do planejamento e da administração diária que afinal os homens realizam seus objetivos de bem-estar, segurança, liberdade, justiça, e proteção do ambiente.
Em relação à revolução energética, Sachs aposta nas energias renováveis, e lembra que a energia nuclear é a aposta do Dr. Fausto — no que ele tem razão, como os acidentes nucleares têm demonstrado. Em relação à revolução verde, não é a revolução verde “aristocrática, dispendiosa de recursos, mas a revolução do ‘evergreen’ que está sendo desenvolvida principalmente na Índia. Quanto à revolução azul, ele aposta na piscicultura e na produção intensiva envolvendo piscicultura, horticultura e arboricultura.

Finalmente, Sachs dá ênfase à cooperação internacional na solução dos grandes problemas ambientais do nosso tempo. Ele sabe o quanto é difícil essa cooperação em um sistema de estados-nação com níveis muito desiguais de crescimento, todos competindo no quadro da globalização. E afirma, fiel à sua visão ao mesmo tempo moral do mundo: “idealmente nós deveríamos nos dedicar a diminuir a taxa de crescimento daqueles que têm uma pegada ecológica bem superior à média mundial, de maneira a permitir àqueles que estão ainda abaixo desse nível de aproveitar sua biocapacidade”. Mas ele é um notável economista que não perde o sentido da realidade, e imediatamente acrescenta: “Mas aí as coisas se complicam. Se as economias do principais países ricos começam a decrescer, será extremamente difícil fazer progredir a produção material dos países que não pertencem ao clube dos ricos” (2011: 27).

Ignacy Sachs sempre foi um crítico severo tanto do neoliberalismo quanto dos ambientalistas defensores do crescimento zero. Nas suas palavras (Sachs 1986: 28), “os ‘zeristas’ (partidários da taxa de crescimento zero) ficaram presos a uma falsa alternativa. Além disso, confundiram dois problemas muito diferentes: a taxa de crescimento (a taxa zero não tendo por si só nenhuma virtude estabilizadora) e a taxa de exploração da natureza. Mais recentemente, ele critica a ideia que hoje se expande na Europa do “decrescimento” — uma retomada das ideias de crescimento zero do início dos anos 1970 — que agora ao invés de acentuar o esgotamento dos recursos naturais, reflete o pessimismo dos europeus em relação ao futuro. O crescimento continuará necessário, lembra Ignacy, enquanto se tratar de dar condições razoáveis de vida para todos: “nós não temos o direito de nos paralisar enquanto não houvermos alcançado um nível decente de consumo material”. Mas para isso é preciso lembrar de Gandhi, para quem o desenvolvimento visava atender as necessidades, não a cupidez. E acrescenta que é preciso lembrar o Padre Lebret que já nos anos 1950 afirmava que “o futuro pertence a uma civilização do ser na repartição equitativa do haver”.6

Para Ignacy Sachs, uma estratégia de desenvolvimento sócio- econômico a longo prazo e ecologicamente consciente deve aspirar à minimização das retiradas sobre os estoques de recursos não renováveis, afinal de contas limitados, procurando não pôr em perigo os equilíbrios térmicos do planeta pelo uso excessivo da energia fóssil e nuclear. No entanto, ela pode e deve tirar o máximo proveito do fluxo de energia solar e de recursos renováveis obtidos através da bioconversão desta energia, atentando sempre para o desencadeamento normal dos ciclos ecológicos, que precisamente asseguram a renovação desses recursos”. Para ele o que se deve buscar são soluções triganhadoras, combinando crescimento, proteção do ambiente, e diminuição das desigualdades. Sachs sempre foi e continua sendo um desenvolvimentista, mas está sempre renovando e atualizando seu pensamento. Por isso não apenas suas ideias mas também sua experiência, sua competência técnica e sua sabedoria têm sido tão valiosas para o Brasil.

Os três grandes desafios que o mundo enfrenta são o desenvolvimento econômico, a igualdade razoável e a sustentabilidade ecológica. Trata-se de promover o desenvolvimento econômico e de fazê-lo de forma a diminuir ao invés de aumentar a desigualdade,assegurando-se que esse desenvolvimento seja sustentável do ponto de vista ambiental. O desenvolvimento econômico é fundamental para os seis bilhões de habitantes dos países ricos e dos países de renda média, como o Brasil, a Índia ou a China. Nesses países ainda há muita pobreza, mas eles têm recursos humanos e de capital para promover seu próprio desenvolvimento econômico. Se contarem com elites e governos identificados com o interesse nacional, os países de renda média poderão, como já está acontecendo principalmente em relação aos países asiáticos dinâmicos, convergir para os níveis de renda dos países ricos. Já para os países pobres, onde vivem um bilhão de pessoas, não há soluções à vista. Nos dois casos, porém, está claro para Ignacy Sachs que é preciso reinventar o Estado desenvolvimentista, que pode e deve assumir muitas formas, “mas uma coisa é certa: apesar do mantra neoliberal que proclama o declínio dos Estados, a responsabilidade assumida pelos Estados desenvolvimentistas aumentou” (2009b: 15). E enumera, em seguida, as cinco áreas em que o Estado desenvolvimentista deverá atuar: (1) articulação, de um lado, com o nível regional e local e, de outro, com o transnacional, na qual “o ponto nevrálgico é a interface entre as nações frágeis e a economia global”; (2) harmonização do social e do ambiental com o desenvolvimento econômico, buscando “soluções triganhadoras”; (3) promoção de associações entre empresas, trabalhadores, o Estado e a sociedade civil; (4) constituição de formas novas e flexíveis de planejamento; e (5) patrocínio de pesquisas públicas sobre temas selecionados relativos ao uso de tecnologia trabalho- -intensiva, de tecnologia poupadora de água e de terra, de mitigação do aquecimento global a novos paradigmas de geração de energia, e, principalmente, de políticas “que assegurem oportunidades de trabalho decente para todos.
Ignacy Sachs não pretendia escrever uma autobiografia. A Terceira Margem originou- se de uma série de entrevistas, que duraram quase um ano, feitas a Thierry Paquot. Mas este, ao final, impressionado com a coerência das respostas e a grandeza do personagem, preferiu retirar suas perguntas, e deixar o belo texto correr em nome do entrevistado, limitando-se a escrever o prefácio. Também ele se deixou encantar por essa grande figura humana e intelectual que é Ignacy Sachs. Um economista e um humanista — um Don Quixote sempre em busca de seus ideais, mas sem perder o espírito realista e pragmático de Sancho Pança; um homem orientado por valores, fiel a seus princípios, mas com capacidade de apresentar soluções viáveis para os problemas que enfrenta. A nave espacial Terra pode ser conduzida de muitas maneiras, com muitos instrumentos, e em todos os níveis da sociedade. Tanto ao nível das ideias e da política quanto das organizações, da vida comunitária, e da ação individual. Sachs valoriza essas ações de construção social desde que elas estejam voltadas para um futuro em que o trabalho seja decente e a dignidade humana, respeitada.


 
 
Referências bibliográficas



KALECKI, Michael (1970 [1993]) “Problems of financing economic development in a mixed economy”.

In


Collected Works of Michal Kalecki, vol. 5: Developing Economies (Jerzy Osiatyñski,



org.). Oxford: Clarendon Press, 1993: 145–169.

SACHS, Ignacy (1963 [1965])


Foreign Trade and Economic Development of Underdeveloped Countries.



Londres: Asia Publishing House. Publicação original em polonês, 1963.

SACHS, Ignacy (1964 [1969])


Capitalismo de Estado e Subdesenvolvimento. Petrópolis: Editora Vozes.



Publicação original em inglês, 1964.

SACHS, Ignacy (1985)


Ecodesenvolvimento: Crescer sem Destruir, São Paulo: Editora Vértice.



SACHS, Ignacy (2007) “The biofuels controversy”. Genebra: UNCTAD, novembro 2007.

SACHS, Ignacy (2009a)


A Terceira Margem. São Paulo: Companhia das Letras.



SACHS, Ignacy (2009b) “Revisiting development in the twenty-first century”,


International Journal of



Political Economy



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SACHS, Ignacy (2011a)


La Main Visible. Angers: Groupe ESA.



SACHS, Ignacy (2011b) “Entering the anthropocene: ‘Geonauts’ or sorcerer’s apprentices?”


Social



Science Information



(Sage) 2011: 462-471.

TSURU, Shigeto (1993) Institutional Economics Revisited. Cambridge: Cambridge University Press.

quarta-feira, 13 de março de 2013

Uma noite em Caracas

 
Nunca pensei em ir à Venezuela. Fui por acaso, há dois anos e meio, em setembro de 2010. Achava que iria desistir de uma viagem à Espanha quando resolvi ligar para a TAM. Usaria milhas e até então só conseguia reservar a ida. O rapaz da TAM propôs uma rota alternativa para a volta: “Senhor, para esta data há a opção de voltar por Caracas. O senhor iria por conta própria de Valência a Frankfurt e, com milhas, faria Frankfurt–Caracas pela Lufthansa, e Caracas–São Paulo–Fortaleza pela TAM”. E ressaltou: “O senhor teria de passar uma noite em Caracas, a conexão para São Paulo só sai no dia seguinte”.
Seria apenas uma noite, não daria para conhecer Caracas. E já que não deu, foram somente um quarto de hotel, um restaurante e uma rápida volta de táxi pela cidade, fiquemos com o que se passou no aeroporto. Não me atrevo a dizer que apenas pelo aeroporto se conhece bem um país. Admitamos, ao menos, que pelo aeroporto tem-se uma ideia.
No aeroporto de Frankfurt, tudo funcionava, era simples, fácil, prático. Você não precisava saber alemão nem inglês, bastava seguir as placas de sinalização, sem se importar com o labirinto percorrido. A eficiência era onipresente. Já no aeroporto de Caracas, onipresentes eram cartazes com fotos de Hugo Chávez e painéis com frases de exaltação às realizações do governo. Você tinha bastante tempo para ler as frases e ver as fotos, a fila não andava. Há filas em quase todos os aeroportos, você há de pensar.
A entrada no país até que foi sem grandes percalços. Os perrengues estavam reservados para o dia seguinte. Não tinha clareado quando fui ao balcão da TAM fazer o check-in. Com o cartão de embarque, prestes a pegar a fila do aparelho de raios X, fui abordado por um policial. Ele perguntou o que eu tinha ido fazer na Venezuela, quantos dias havia passado lá. Em outros países, essa pergunta é feita na chegada e não na saída. “A fila do aparelho de raios X”? Deveria ter dito “as filas”. Sim, passamos por duas filas, foram dois aparelhos, eu nunca tinha visto isso em nenhum aeroporto.
Quando você chega ao portão de embarque e senta-se numa daquelas cadeiras já de frente para a “sanfona”, aquela passarela metálica que vai levá-lo à aeronave, sua sensação costuma ser de alívio. Todos os obstáculos foram vencidos, afinal. Foi essa a sensação que também tive. O alívio foi diminuindo, no entanto, à medida que a fila dentro da passarela só aumentava. Estranho. Em todo aeroporto, essa fila é rápida, você simplesmente mostra o cartão de embarque a uma das aeromoças e ela indica o corredor mais próximo da poltrona. Fui um dos últimos a pegar a fila. Só no fim, avistei uma senhora de farda. Quase na porta do avião, ela revistava todas as bagagens de mão. Aquelas mesmas bagagens que já haviam sido revistadas por dois aparelhos de raios X.
Na poltrona ao lado, sentou-se um cubano. Ele morava em Caracas havia alguns anos. Perguntei-lhe por que motivo havia tanta gente fiscalizando no aeroporto. Inocentemente, perguntei se o objetivo era dar oportunidade de trabalho a mais pessoas e assim diminuir a taxa de desemprego. Ele fez cara de desaprovação:“Que nada. É para causar a sensação de que o estado está sempre presente, atento. Mas você deve ter percebido que isso é falso, você não tem sensação de segurança nem de eficiência.”
A imigração, em todo aeroporto, é sempre mais rigorosa na entrada do que na saída. Sobrou a sensação de a Venezuela ter sido o único país em que sair foi mais difícil do que entrar.
acoelhof

segunda-feira, 4 de março de 2013

Banco Mundial lança campanha contra violência às mulheres


 
Em homenagem ao dia Internacional das Mulheres, e tendo referência o alto índice de violência da qual são vitimas, o Banco Mundial lança neste 1º de Março a campanha “Homem de verdade não bate em mulher”.
 
A iniciativa visa fomentar o debate sobre a violência e ampliar a conscientização sobre essa situação, e conta com a participação de artistas brasileiros. Entre eles estão os atores Cauã Reymond, Gabriel Braga Nunes, Thiago Fragoso e Rodrigo Simas, o judoca Flavio Canto, que posaram com o cartaz da campanha sem cobrar cachê. A única participante mulher é Maria da Penha Maia Fernandes, que dá nome à lei Maria da Penha, promulgada em 2006, legislação que defende os direitos da mulher e punições para os agressores.
A importância dessa conscientização se dá mediante a proporção da violência doméstica contra as mulheres apontada no Mapa da Violência 2012- Homicídios de Mulheres no Brasil, no qual confirma que uma em cada cinco mulheres brasileiras denunciam já terem sofrido violência dentro de casa. Em 80% dos casos, os agressores são namorados e maridos.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Fim de linha para o burburinho causado pelo telefone fixo

 

Por Lucy Kellaway - Valor 18/02

No LinkedIn há uma foto de David Cameron em sua mesa no número 10 da Downing Street fazendo um telefonema para o presidente americano Barack Obama para cumprimenta-lo pela sua reeleição. Ela faz parte de uma série de imagens de personalidades flagradas enquanto trabalham - há, por exemplo, uma fotografia de Sir Richard Branson passeando de sunga em uma praia tropical, e outra do guru da autoajuda Deepak Chopra, meditando diante do que parece ser um grande ovo de pedra.
As duas últimas imagens são um pouco estranhas, mas não tanto quanto a primeira. Há um certo anacronismo na imagem do primeiro-ministro britânico no trabalho, embora à primeira vista eu não tenha percebido exatamente o que estava acontecendo. Não se trata das paredes almofadadas ou da antiga mesa lateral. Nem mesmo suas abotoaduras ou a gravata. Tudo isso é tradicional e sóbrio, mas não está exatamente fora de lugar.
Mas aí eu descobri: trata-se do fio bobinado plastificado que sai de uma de suas orelhas e termina em um objeto que está sobre a mesa. O primeiro-ministro está fazendo o que quase ninguém faz mais: conversando com alguém através de uma linha fixa de telefone. Até mais ou menos uma década, o telefone do escritório era o símbolo do trabalho de colarinho branco. Era a coisa mais importante em qualquer mesa: todas as fotografias de homens poderosos os mostravam falando com urgência com alguém por um telefone fixo. Mas, agora, esses aparelhos desajeitados estão em sua maior parte silenciosos, com seus receptores nos ganchos.
Apenas o primeiro ministro tem uma desculpa para continuar usando esse aparelho ultrapassado. Se ele quiser ter uma conversa ultrassecreta com Obama, um fio de cobre é uma aposta mais segura que as micro-ondas. Qualquer pessoa, dentro de um determinado alcance, e com uns US$ 200 para comprar uma tecnologia de espionagem, poderia ouvi-lo dizer: "Parabéns, senhor presidente".
Para o resto de nós, a telefonia fixa não tem mais propósito. Na semana passada, visitei a principal redação da BBC, onde dezenas de pessoas trabalharam duro. Apenas uma pessoa usava telefone fixo.
Meu próprio telefone grande e cinza da Cisco descansa silencioso sobre minha mesa, e quando ele às vezes decide tocar, geralmente nem atendo.
A ideia de atender quando não sei quem está do outro lado da linha me deixa um pouco temerosa. Uma luz vermelha indica que tenho mensagens na secretária eletrônica, mas não as ouço há pelo menos um ano.
Decidi, porém, descobrir o que perdi nesse tempo todo. Demorou um pouco, pois havia esquecido minha senha, mas depois vi que mais de 100 mensagens esperavam pacientemente para serem ouvidas - tantas que a caixa postal se recusava a registrar novas mensagens.
O primeiro correio de voz dizia o seguinte: "Oi, Lucy, aqui é a Márcia. Estou apenas tentando confirmar se você recebeu um e-mail que mandei...". Apertei o delete. A segunda mensagem: "Olá, Lucy. Liguei rapidinho - sou xx da yy e queria atualizar nossos dados para contato…".
E assim foi. Todos os recados eram inúteis ou repetiam informações que eu já havia recebido por e-mail ou mensagem de texto. Ao não responder o telefone por um ano eu não havia perdido nada, além de ganhar muito em termos de eficiência e controle.
Aquilo havia me permitido falar apenas com as pessoas que eu queria e nos momentos mais adequados para mim. O "Financial Times" emprega hoje um terço das pessoas que direcionam o tráfego telefônico dentro da empresa do que há uma década. Ninguém pede mais para ser transferido para um colega do mesmo prédio, preferindo em vez disso passar um e-mail. E as ligações externas estão diminuindo: o número médio recebido em nosso principal número entre as 18h e as 22h é de apenas 50.
Coisa parecida aconteceu em casa, onde o telefone fixo está ainda mais silencioso. Isso tem sido bom, uma vez que a gente não perde tempo respondendo a todas as chamadas. Nada mais de namorados rejeitados querendo falar com Sylvia e tendo que passar primeiro pela mãe de Sylvia; eles agora acabaram com o intermediário. Os namorados podem preferir o novo sistema, mas ele é pior para a família, que não sabe mais o que eles estão tramando.
O mesmo se aplica ao local de trabalho. A morte da telefonia fixa pode ser melhor para nós individualmente, mas é pior para os laços que nos unem. O mais triste é a mudança que isso causou no clima dos escritórios. Não há mais telefones barulhentos tocando, criando murmúrios e urgência. E o pior é que não ouço mais meus colegas brigando com as esposas, maridos e com os pedreiros que estão reformando suas casas: a maioria da roupa suja é lavada longe das mesas do trabalho.
Antes, eu achava essas ligações turbulentas irritantes. Mas, agora que a porta para a vida privada de meus colegas de trabalho foi fechada, eu gostaria de poder abri-la novamente.

Lucy Kellaway é colunista do "Financial Times".



 

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Montevidéu, soprando e mordendo

 
 
Por acoelhof
 
Se você pensa em um dia ir a Montevidéu, guarde o que segue, pode ser útil. Caso contrário, não leia, não perca seu tempo.
 
Vou soprar e morder, comentar os pontos positivos e negativos da viagem.
 
Soprando: no Guia de Montevidéu (www.viajenaviagem.com.br), mestre Ricardo Freire foi muito feliz ao escolher as quatro fotos para o “quando ir”,“como chegar”, “onde ficar?” e “o que fazer”: a praça Independência, o teatro Solis, a orla de Pocitos e o Mercado del Puerto, na cidade velha. São esses os pontos obrigatórios de visita (para quem for fanático por futebol, acrescentaria o estádio Centenário).
 
Mordendo: Montevidéu tem poucas atrações, não há muito o que fazer. Dois dias inteiros bastam. Ricardo Freire foi muito gentil quando chamou Pocitos, o melhor bairro para se hospedar, de “Ipanema-Leblon”. Pocitos é uma Ipanema-Leblon com cara de Copacabana dos anos 70, mas sem atrativos.
 
Soprando – Se você combinar o passeio com Punta del Leste, vá em janeiro ou fevereiro.
Mordendo – Se você for somente a Montevidéu, evite janeiro, é muito quente, vá em março ou abril.
 
Soprando: Montevidéu é extremamente arborizada, com muitos parques, e tem uma orla gigante com mais de 20 quilômetros – começa no porto, na cidade velha, e vai até próximo do aeroporto, em Carrasco. Em grande parte da orla, pode-se caminhar, andar de bicicleta, praticar esportes. Não há no Brasil uma cidade que proporcione no quesito parques-orla tanta qualidade de vida. Ponto para quem mora lá.
 
Mordendo: parte da cidade parece abandonada, há muitos edifícios mal conservados, até mesmo em áreas nobres da orla. Fico imaginando a Montevidéu dos anos 30 aos 60, quando quase tudo aquilo já existia, a cidade era uma das mais prósperas da América Latina. Cheiro de tinta, coisa nova, só no bairro dos engomados, Carrasco. Edifícios modernos, uns três, na avenida Dr. Luis de Herrera. Montevidéu parou no tempo.
 
Soprando: a cidade transmite segurança, você pode andar tranquilo pelas ruas, nos melhores bairros, mesmo à noite. Os uruguaios são um povo simples, gentil, que trata bem o turista. Eles ainda têm o bem mais valioso de todos, segurança, um bem que não tem preço e que nós, brasileiros, nunca vamos desfrutar dele.
Mordendo: as ruas não são bem iluminadas, mesmo as próximas da orla, em áreas consideradas nobres. Nos cruzamentos, há jovens limpadores de para-brisas como no Brasil e malabaristas no sinal fechado.
 
Soprando: você pode pagar suas contas em quatro moedas – peso uruguaio, peso argentino, dólar ou real.
 
Mordendo: Montevidéu é uma cidade cara. Li nos jornais de lá que o Uruguai perdeu competitividade no turismo. Os argentinos têm optado pelo Caribe e por Miami. Em Punta del Este é pior, os preços são novaiorquinos. Vi muitos brasileiros pagando em real, mas isso não é vantajoso. Com a cotação que os uruguaios usam para o real, a conta aumenta uns 10%.
Soprando: táxi é barato. A maioria das corridas, partindo de Pocitos, não passa de 15 reais.
 
Mordendo: os taxistas uruguaios não são tão desonestos quanto os argentinos, mas é bom ficar atento. Usam uma tabela para converter o valor da corrida em pesos. Cuidado na conversão e com o trajeto. Alguns dão um jeito de esticar a corrida. Uma saída é se familiarizar um pouco com a cidade, ver bem o mapa antes, e indicar uma avenida principal que o taxista deve pegar. Na volta, de Pocitos, na corrida para o aeroporto o taxímetro marcou 440 pesos. Eles cobram 640. Em reais, é só cortar o zero.
 
Soprando: “Pepe” Mujica, presidente do Uruguai, está dando um desconto de quase 20% para pagamentos no cartão de crédito. É a devolução do imposto, o IVA, para os estrangeiros. Ela é automática, você não precisa pedir depois.
 
Mordendo: o desconto acaba agora em março de 2013.
 
Soprando – Hotel: Cala di Volpi. Fica na Rambla Gandhi, em Pocitos. É muito bem localizado. O hotel fornece bicicletas para passeios na orla. A suíte corner, só um pouco mais cara, é bem ampla e tem uma bela vista da orla. Da para ir a pé aos melhores restaurantes de Montevidéu e ao shopping Punta Carretas.
 
Mordendo: bem que a diária poderia ser mais barata, saiu por 170 dólares. A bicicleta é grátis apenas na primeira hora. O hotel só informa isso depois que você pega a bicicleta. Punta Carretas é o melhor shopping de Montevidéu, mas deixa a desejar, comparado aos brasileiros. E não é bom para compras, é caro.
 
Soprando: recomendamos os quatro restaurantes que seguem, pela ordem de preferência. Com exceção do Garcia, que fica longe, em Carrasco, os outros três ficam próximo da Rambla Gandhi. Os melhores restaurantes e bares de Montevidéu ficam em esquinas. Curioso.
Francis (Luis de la Torre esquina com Montero). Ambiente aprumado, atendimento de primeira, um dos mais caros, por óbvio.
Garcia (Av. Arocena, em Carrasco, próximo ao hotel Casino Carrasco). Aqui comemos a melhor carne da viagem.
La Perdiz (Guipúzcoa esquina com Baliñas, do outro lado da praça do Sheraton).
Tabaré (José Zorrilla de San Martin esquina com Tabaré).
 
Mordendo: os poucos bons restaurantes de Montevidéu são caros. Uma conta-casal, sem vinho, na base de água e uma cerveja, sem sobremesa, beira uns 150 reais. Há o cubierto, uma entrada que eles sempre cobram. Então, pelo menos prove um pouquinho. Para não ficar tão caro, arrisque o “para compartir” em alguns pratos. A gorjeta não está incluída. Não se esqueça dos 10% dos garçons.
 
Soprando – Bares: recomendo apenas o Bar 62 (Miguel Barreiro esquina com Alejandro Chucarro) e o Bar Tranquilo (21 de Setiembre esquina com Roque Graceras). Sempre em esquinas, lembram? Ambos são frequentados por nativos. Na orla, na Rambla Gandhi, o Che Montevideo. Para um programa bem turístico, sem nativos, o Fun Fun.
 
Mordendo: o atendimento do Bar Tranquilo foi muito lento. O garçom demorou a trazer o cardápio, demorou a trazer o prato, demorou a trazer a conta. Só não demorou na hora de receber a propina, a gorjeta. O Che Montevideo está precisando de uma boa reforma. O ambiente está bastante caído. O Fun Fun é um pega-turista. Toda cidade tem pega-turistas. São aqueles lugares que os nativos não frequentam porque sabem que não valem a pena. Por falta de opção, você vai acabar indo ao Fun Fun numa sexta ou num sábado. Muito provavelmente, suas expectativas não serão atendidas.
 
Há três tipos de cidades: as que você nunca deve ir; as que você deve ir apenas uma vez na vida; e as que você deve ir, e sempre que puder, voltar. Exemplo de três, pela ordem: Assunção, Montevidéu e Buenos Aires.
 
Só volto a Montevidéu, se um dia o Fortaleza decidir a Taça Libertadores com o Peñarol. Tá bom, se for o Ceará, também vou lá apoiar os conterrâneos.
 
Abraços
acoelhof

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Carta Maior - Arte & Cultura - Com Gael Garcia Bernal, filme conta como um publicitário superou o General Pinochet

Carta Maior - Arte & Cultura - Com Gael Garcia Bernal, filme conta como um publicitário superou o General Pinochet

'Como vencer a pobreza e a desigualdade'



Tema: 'Como vencer a pobreza e a desigualdade'
Por Clarice Zeitel Vianna Silva -
UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro - Rio de Janeiro - RJ

'PÁTRIA MADRASTA VIL'

Onde já se viu tanto excesso de falta?
Abundância de inexistência...
Exagero de escassez...
Contraditórios?
Então aí está!
O novo nome do nosso país!
Não pode haver sinônimo melhor para BRASIL.

Porque o Brasil nada mais é do que o excesso de falta de caráter, a abundância de inexistência de solidariedade, o exagero de escassez de responsabilidade.
O Brasil nada mais é do que uma combinação mal engendrada - e friamente sistematizada - de contradições.

Há quem diga que 'dos filhos deste solo és mãe gentil', mas eu digo que não é gentil e, muito menos, mãe.
Pela definição que eu conheço de MÃE, o Brasil, está mais para madrasta vil.
A minha mãe não 'tapa o sol com a peneira.'
Não me daria, por exemplo, um lugar na universidade sem ter-me dado uma bela formação básica.

E mesmo há 200 anos atrás não me aboliria da escravidão se soubesse que me restaria a liberdade apenas para morrer de fome. Porque a minha mãe não iria querer me enganar, iludir.
Ela me daria um verdadeiro Pacote que fosse efetivo na resolução do problema, e que contivesse educação + liberdade + igualdade. Ela sabe que de nada me adianta ter educação pela metade, ou tê-la aprisionada pela falta de oportunidade, pela falta de escolha, acorrentada pela minha voz-nada-ativa.

A minha mãe sabe que eu só vou crescer se a minha educação gerar liberdade e esta, por fim, igualdade.
Uma segue a outra...
Sem nenhuma contradição!

É disso que o Brasil precisa: mudanças estruturais, revolucionárias, que quebrem esse sistema-esquema social montado; mudanças que não sejam hipócritas, mudanças que transformem!
A mudança que nada muda é só mais uma contradição.
Os governantes (às vezes) dão uns peixinhos, mas não ensinam a pescar.
E a educação libertadora entra aí.
O povo está tão paralisado pela ignorância que não sabe a que tem direito.
Não aprendeu o que é ser cidadão.

Porém, ainda nos falta um fator fundamental para o alcance da igualdade: nossa participação efetiva; as mudanças dentro do corpo burocrático do Estado não modificam a estrutura.
As classes média e alta - tão confortavelmente situadas na pirâmide social - terão que fazer mais do que reclamar (o que só serve mesmo para aliviar nossa culpa)...
Mas estão elas preparadas para isso?

Eu acredito profundamente que só uma revolução estrutural, feita de dentro pra fora e que não exclua nada nem ninguém de seus efeitos, possa acabar com a pobreza e desigualdade no Brasil.
Afinal, de que serve um governo que não administra?
E de que serve uma mãe que não afaga?

E, finalmente, de que serve um Homem que não se posiciona?
Talvez o sentido de nossa própria existência esteja ligado, justamente, a um posicionamento perante o mundo como um todo. Sem egoísmo.
Cada um por todos.

Algumas perguntas, quando autoindagadas, se tornam elucidativas.
Pergunte-se: quero ser pobre no Brasil?
Filho de uma mãe gentil ou de uma madrasta vil?
Ser tratado como cidadão ou excluído?
Como gente... Ou como bicho?
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Premiada pela UNESCO,
Clarice Zeitel Vianna Silva, 26, estudante que termina Faculdade de Direito da UFRJ, em julho, concorreu com outros 50 mil estudantes universitários. Ela acaba de voltar de Paris, onde recebeu um prêmio da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) por uma redação sobre 'Como vencer a pobreza e a desigualdade.' A redação de Clarice, intitulada 'Pátria Madrasta Vil', foi incluída num livro, com outros cem textos selecionados no concurso. A publicação está disponível no site da Biblioteca Virtual da UNESCO.