quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

O Perfil Psiquiátrico do Corrupto

Por Alexandre Pimentel*

 A missão deste artigo não é fácil, principalmente pelo fato de seu autor, apesar de cidadão ativo e extremamente observador, não ser médico nem psiquiatra. Analisar o comportamento do corrupto é algo tão amplo que mereceria um tratado que observasse desde a corrupção daquele que leva os talheres de um restaurante para casa, até aquele que comete desatinos em nome da ciência ou que sacrifica uma população inteira para satisfação de seus desejos pessoais. A idéia deste texto é apresentar elementos básicos para compreendermos a atitude de quem usurpa, rouba e compromete a vida do coletivo.

O dicionário Aurélio define corrupção como algo podre, corrompido, devasso, depravado, que se deixou corromper ou subornar. Etimologicamente o substantivo femininocorrupção deriva do latim corruptio, com o sentido de deterioração, ato, processo ou efeito de corromper. Há também a compreensão que se refere à palavra “ruptura”, que pode significar o rompimento ou desvio de um código de conduta moral ou social.

  Empiricamente acredito que a palavra “corrupto” possa ter origem comum com “carrapato”, ao menos há semelhança entre elas, tanto na fonética quanto na atitude de ambos, ou seja, sugar energia que não lhe pertence, invadir uma estrutura com interesse particular em detrimento da vitalidade do outro, cometer o parasitismo social cujo impacto seja catastrófico em todos os sentidos. Interessante atentarmos para a possibilidade de um carrapato matar um boi enorme e também para o cuidado de não eliminarmos um boi para matarmos um carrapato.

 Os interessados em conhecer o impacto da corrupção e a classificação de países quanto à prática corrupta, têm na Internet uma grande quantidade de informações. As ONGsTransparência Brasil e Transparency International, entre dezenas de outras, apresentam uma série de importantes dados, tanto para os estudiosos quanto para o cidadão comum, maior vítima de todo o processo. Sugerimos, também, o interessante artigo “Quanto custa a corrupção?”, de Ecléia Conforto, publicada no jornal Extra Classe, do Sindicato dos Professores do Rio Grande do Sul. Segue anexo, como ferramenta de pesquisa, o “mapa de riscos da corrupção”, publicado pela Transparência Brasil.

  Na condição de redator de um trabalho tão delicado, me sinto na tentação de produzir um livro completo, mas, nesse momento, dados os acontecimentos da vida pública brasileira, sinto necessidade em centrar o foco no perfil psiquiátrico do corrupto. Como acadêmico de serviço social e pesquisador honoris causa de ciências políticas, tenho no sítioHumanitarismo 21, grande fonte de inspiração e uma arejada pesquisa sobre a consciência das massas, matéria absolutamente necessária para um vislumbre maduro da macropolítica e dos porquês sociais da corrupção

 Para compreendermos o corrupto, seja ele da política, da polícia, da empresa, da ciência ou de outras áreas, é necessário sabermos quem é o psicopata. Seria exagero ligar corrupção e psicopatia? O Dr. João Augusto Figueiró, psicoterapeuta do Instituto de Psiquiatria do Hospital de Clínicas da Universidade de São Paulo, em entrevista à rádio CBN, explica “o que torna uma pessoa corrupta”. O Dr. Figueiró também afirma, em entrevista ao jornal O Globo, que “a corrupção é mal que não tem cura”. Apesar da abordagem, a nosso ver, ser cerebrocêntrica, muitas coisas interessantes são colocadas, entre elas, exatamente a ligação íntima entre corrupção, psicopatia e sociopatia.

O fato de não se abalar com a dor alheia, de não ter sentimentos de responsabilidade, piedade ou compaixão, de ser frio e calculista, permeia tanto a conduta do corrupto quanto do psicopata e do sociopata, a ponto de podermos afirmar que essas três pessoas, em linhas gerais, são, na verdade, uma só. Na política, por exemplo, temos os que desviam verbas destinadas à assistência social e à educação com avassaladores prejuízos à sociedade. Na ciência, encontramos pesquisadores comprados por interesses comercias, cuja missão é provar a qualquer custo, aquilo que beneficiará seus superiores, mesmo que coloque em risco a saúde ou a vida de seres vivos. Podemos incluir nesse rol a utilização desnecessária da vivissecção que consiste em cortar animais vivos para testes e pesquisas, na maioria das vezes já conhecidos. No campo da religião institucionalizada também podemos verificar toda sorte de corrupção, desde a hipnose de grupos até a histeria coletiva, baseadas no literalismo histórico e visando volumosas arrecadações destinadas a causas mundanas. A religiosidade é a base ética e metafísica da existência, mas quando deturpada se torna cúmplice da mediocridade.

  Se olharmos sinceramente para as características da sociedade contemporânea, perceberemos a quase total impossibilidade de vivermos à parte da corrupção. Toda vez que praticamos atos considerados legais do ponto de vista da lei, mas perversos quanto aos impactos deletérios e efeitos colaterais sociais, estamos, em maior ou menor grau, sendo corruptos. Por exemplo, os investimentos em bolsas de valores, a utilização voluntária de combustíveis fósseis, o consumo ostensivo de alimentos e derivados animais gerados na crueldade ou no artificialismo, a opção deliberada por gêneros alimentícios produzidos a partir de agrotóxicos ou transgênicos, o consumo de drogas permitidas como álcool e tabaco, o envolvimento em cultos embasados na arrecadação comercial, na exploração da fé ou na oferenda de animais, a não separação de lixo orgânico e seco, a dita mentira branca da vida diária e, entre vários outros, o vício na maledicência, sem a devida percepção das diferenças de capacidades humanas.

 É claro que o cidadão comum, em sua inocência inconsciente, não tem, na maioria das vezes, noção da própria prática corrupta. Ele reproduz os condicionamentos impostos pela mídia, repete o comportamento das novelas e, finalmente, utilizando um modelo de eleitoral também corrupto na concepção, elege representantes que conseguem enganá-lo, mesmo que o histórico destes inclua a indevida posse de recursos públicos, aliás, o senso comum tem como normal prática do “rouba mas faz”, fazendo com que políticos do mal ligados a práticas paternalistas se reelejam por vários mandatos.

O combate à corrupção é profundamente necessário, mas, mais urgente, é desenvolvermos métodos de prevenção. Métodos que – no campo da política - não são contemplados pelas eleições diretas onde a base é obrigada a escolher representantes que realmente não conhece. Há uma distância hedionda entre, por exemplo, um senador e a dona Maria do interior da Amazônia que marcou X para escolhê-lo. Esta distância se reduz no caso do vereador de uma pequena cidade, mas ainda não é suficiente para que o princípio da responsabilização e da boa gestão funcionem. O ideal, num olhar humanitarista, seriam eleições de pequenas bases, onde micro comunidades escolhessem pequenos colégios de representantes que, de forma escalonada, escolhessem as linhas ascendentes, envolvendo a cidade o estado e o país. Essa formatação mais fraterna certamente não só reduziria a malignidade mas, certamente, ampliaria as possibilidades de um equilibrado desenvolvimento ecossocial humanitarista.          

O modus vivendi da civilização urbano-industrial pode ser resumido pelo mito da caverna de Platão onde as pessoas vivem sem acreditar que exista o céu, o mar, as estrelas e o infinito. Vivemos presos aos padrões dominantes onde a escuridão dos tempos não nos permite enxergar. Não temos noção do que acontece nos bastidores do domínio, seja na câmara legislativa, nos poder executivo, na indústria do remédio e do alimento ou na empresa que deseja competir a qualquer custo. Estamos emersos numa prisão onde necessitamos lutar pela dignidade mínima, pela higiene básica, pela assistência primária, por água, ar, comida e por um contrato inicial de convivência.

É emergente um plano humanitário de liberdade social e reconstrução ambiental, mas enquanto ele não acontece de forma concreta – e talvez demore muito - sob os escombros de um mundo decadente, devemos utilizar uma grande quantidade de câmeras escondidas que mostrem ao mundo o que acontece em nossas costas. As câmeras, que também podem ser ferramentas para mostrar coisas boas, não resolverão o problema mas estimularão observações e poderão espantar certos seres mal intencionadas.

A crise de valores e paradigmas que experimentamos também é oportunidade de transformação interior. Mesmo na adversidade devemos fazer um esforço sobre-humano para que nossa vida seja exemplo de ética e luta por direitos básicos. Assumir o desafio de ser um cidadão de bem num ambiente obscuro é tarefa para fortes. Se ainda não conseguimos acabar com a corrupção externa, imposta pelo mundo, ao menos dentro de nós, devemos trilhar o caminho da integridade possível, onde o nós seja prioridade ao eu e o individual exista para benefício do coletivo.

*Alexandre Pimentel é escritor, ambientalista e palestrante. Vide http://www.alexandrepimentel.com.br/.

Colaborou Elza Ines

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