sexta-feira, 20 de abril de 2012

AS HIENAS E OS CORRUPTOS


Por Jacob Fortes via aparicio.secundus




Entre os animais irracionais existem os inofensivos, os peçonhentos, os transmissores de doenças, os asquerosos, e assim por diante. Dentre os últimos, chama atenção, em particular, a desaprumada hiena. Primeiro, pela tendência inata de alimentar-se de carcaças de animais que encontra ou rapina de outros carnívoros; segundo, pela fealdade, de causar repugnância aos olhos; e, terceiro, pela sua fetidez inigualável.

Diferentemente das hienas, há, entre os humanos, aqueles que, mesmo em aparições raras e fugidias, se fazem notar não apenas pelo perfume que agradavelmente vão recendendo, mas, sobretudo, pelo trajar distinto que os embelezam. Por onde passam lhes são prestados acatamentos e reverências já que suas figuras comedidas e afidalgadas faz parecer tratar-se de pessoas de indiscutível honorabilidade. A plácida postura de cordeiro, que simulam, lhes reforça a crença de serem pessoas de quem não se pode suspeitar. Aludo aos corruptos.

Enquanto as hienas, de hábitos noturnos, se comunicam naturalmente fazendo ressoar, na imensidão da noite, seus ganidos ásperos de efeito pavoroso, os corruptos, de hábitos diurnos, são silenciosamente discretos: não se deixam assobiar nem cantarolar, porém, à boca miúda, são excelentes comunicólogos; se fazem entender por mensagens codificadas. Quando não, optam por balbuciar locuções breves, por vezes monossilábicas, uma espécie de confusa linguagem de papagaio: ininteligível para muitos, mas facilmente entendida por seus acumpliciados. Ao serem flagrados em gravações telefônicas não mostram as suas caras, já que são invisíveis, mas por meio de notas injuriadas, vindas do além, denegam tudo e, principalmente, desqualificam quem as gravou. Por essas notas descobre-se que eles têm verdadeira predileção por certos advérbios, sobretudo o de negação: não conheço, nunca vi, jamais falei, tampouco ouvi.

As hienas, no papel de lixeiras, ao consumirem cadáveres, evitam a disseminação de doenças em favor do equilíbrio ecológico. Os corruptos, com sua insaciável gula de esponja, que ultrapassa o exclamar dos seus estômagos e suas ambições inescrupulosas, drenam os recursos públicos mediante o emprego de manobras fraudulentas. Nesse ofício de gatunagem causam o retesamento das rédeas da prosperidade nacional; alicerçam desabrigos; adoentam áreas consideradas vitais para as camadas mais necessitadas da população: hospitais, escolas, infância, velhice, segurança pública; alargam os caminhos dos presídios, defuntam feições; produzem carcaças fazendo crescer o corpo de voluntários, do submundo, que tem procuração para aplicar a pena máxima. No “solo gentil” não existem as poderosas hienas, das planícies africanas, devoradoras de carcaças, mas no “formoso céu”, de prontidão, os urubus monitoram os morrediços. Além de fazerem a recolha do lixo, de brinde, emprestam sua figura para que os rubro-negros a tornem a mascote flamenguista.

Tais quais os passarinhos, as hienas também são animais gregários. Os corruptos, no entanto, preferem viver solitariamente desacompanhados; despercebidos. Reforgem quando sob olhares fixos; repudiam interpelações. Caricaturados de Lombardi, esses escroques dos impostos do contribuinte, ainda que invisos aos olhos de todos, podem ser vistos, ocultamente, por alguns poucos aparceirados de gabinetes que, no silêncio das desoras, os ciceroneiam pelos caminhos atalhados e obscurecidos que levam aos recursos públicos; tao sedutores quanto evidentemente malcuidados. Recursos que exalam o suor dos trabalhadores brasileiros, e, também, o sangue tupiniquim que tanto atrai os vampiros dípodes, os quais, a exemplo dos morcegos, se esquivam da luz do sol. Com tamanha vocação corruptível, de duas uma, ou o país não é nosso, se fosse já teríamos extirpado essa chaga, ou nós não lhe pertencemos; vestimos o que nos dão.

Ao contrário da postura discretamente recatada que singulariza essa espécie de malfeitores, há uma variedade que prefere viver de de maneira ruidosa. São os caraduras, popularmente conhecidos por caras-de-pau, que recorrem ao populismo e outros expedientes sagazes para, à cretinice e falsa fé, insinuar que são legítimos emissários da honradez e da ética. Invariavelmente são encontrados no meio político, mormente no legislativo municipal, estadual e federal. Escudados pela legitimidade de mandato eletivo, e devidamente maquiados pelos efeitos acobertadores do óleo de peroba, se proclamam, em tom de austeridade, legítimos guardiões da retidão. Apesar dos seus discursos eloquentes, em favor da descência, alguns de causar arrebatamentos de fazer inveja às imponentes cachoeiras, proferidos do alto das tribunas, não passam, na substância, de embusteiros; desgraçadamente sufragados pelos eleitores. Para esses promesseiros fementidos, o provérbio secular adverte: “o gato rude que cuida, disto usa”

Contudo, esperançar é dávida natural da vida. Oxalá possa o astucioso progresso tecnológico, inventar máquinas capazes de identificar e caçar almas, visagens, sombras, fantasmas e silhuetas de contornos não identificado que, tencionando surripiar, vagueiam pela penumbra dos erários.

E enquanto as máquinas caçadoras não chegam, esses seres inabordáveis, agenciadores das desditas do povo, vão esvaziando os cofres públicos. Afeitos à desgraça produzida pela voluptuosiade do absurdo, os contribuintes, afrontados, exauridos e vergados por pesados fardos de impostos, se encarregarão — até que o jumento se torne profeta — de reabastecê-los, sob o amargo ressaibo de que os salteadores permanecerão impunes, inclusive porque a punibilidade não alcança seres espectrais. No entanto, já que o brasileiro tem forte apego a crendices, superstições, mandingarias e benzeduras, que tal o país, unido, valer-se desses expedientes para ver se afugenta esses fantasmas ratoneiros?


Jacob Fortes

Jacob Fortes de Carvalho Carvalho [mailto:jacobfortes@yahoo.com.br]

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