segunda-feira, 25 de julho de 2011

Colunista da RIONET tem texto escolhido



O texto "Dois amigos" de, Mario Marcio Damasco, colunista da Rionet, foi escolhido para fazer parte do livro “68 - A geração que queria mudar o mundo – relatos”. A publicação é fruto do esforço coletivo em favor da luta contra o esquecimento daquele que foi um dos períodos mais deploráveis da história brasileira e insere-se no projeto Marcas da Memória da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça. Prestaram depoimentos nomes como o de Milton Coelho da Graça, Arthur Poerner, Maria Lucia Dahl, Norma Bengell e João Otávio Goulart Brizola.

"Além de mim, apenas dois outros colegas se interessavam, de longe, pelo assunto. Lá uma vez ou outra conversávamos a respeito. Influenciados pelos pais, eles acreditavam, sem embasamento ou convicção, nas boas intenções da recém instalada “revolução”.

Desde o início e com maior intensidade em 1965, tentei alertar-lhes para a truculência de um movimento que “regulamentava’’, através da força, a violência das suas atitudes. Contudo, eles se recusavam a acreditar.

Nesse ano, três acontecimentos foram sintomáticos.

Em uma noite, esses dois amigos me acompanharam até colégio. Fazíamos “hora” na entrada, quando vimos chegar, de braços dados, o diretor e a sua esposa. “Cantando pneus”, surgiu, no início da rua, um jipe recheado de policiais. Separaram, com brutalidade, o casal. Algemaram o homem e jogaram-no dentro do jipe. Meus dois amigos não me encararam, apenas se entreolharam em silêncio. O diretor, homem estimado e reconhecido na cidade e que pertencia a um partido de esquerda, foi preso e destituído do cargo, sob a alegação de ser um perigoso “comunista comedor de criancinha”.

Sob nossas vistas, a caminhonete do DOPS, parou em frente ao sindicato dos metalúrgicos. Os policiais invadiram o prédio e quebraram tudo à procura do presidente, que não se encontrava. Após alguns minutos, calmamente, surgiu o presidente do sindicato. Foi preso e algemado como um perigoso “agente vermelho”. Ele não fazia parte do nosso convívio, mas, sabíamos que era um correto e pacato cidadão. Quem sabe, apolítico? Novamente, os dois não tiveram condições de me encarar.

Salão de sinuca no centro de Friburgo. Um desses meus amigos ganhou uma disputa a dinheiro de um policial do Dops de revólver à mostra. O sujeito não se conformou. A confusão se estabeleceu. O policial empunhando a arma, acintosamente, ameaçou a todos. Sem outro jeito, fomos embora. O meu amigo desabafou:

- “Depois dessa maldita revolução, qualquer policial de merda virou autoridade!”.

Aprovados no vestibular no início de 1966, os dois amigos mudaram-se para Niterói.

No primeiro final de semana de abril de 2007 estavam em Friburgo. Na noite de sábado, a turma estava reunida. Percebendo que eles apresentavam escoriações pelo corpo, não resisti e perguntei o que aconteceu.

- “Esses são os ”prêmios” oferecidos pelos militares pela nossa participação nos protesto pela invasão do restaurante do “calabouço” e pela morte do Edson Luis, aquele estudante de 17 anos...”, responderam.

E depois, me olhando no fundo dos olhos, completaram:

“Tomamos muita porrada, mas enfrentamos aqueles brucutus. Estamos de alma lavada! Faltou você! Mesmo apanhando, você ia se realizar! Igual a gente!”.”

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